domingo, 19 de fevereiro de 2012

A liberdade tem seu tempo.





Quando somos crianças, nossa liberdade é a mínima possível. Qualquer decisão sobre nossas vidas é feitas por nossos pais (ou responsáveis). A medida que crescemos e adquirimos consciência e responsabilidade sobre nossos atos, temos a nossa liberdade aumentada. Por este exemplo simples, fica claro que liberdade é um privilégio conquistado através do mérito de nossas ações e da responsabilidade que mostramos ao fazermos nossas escolhas.

Na UFABC, acredito que há uma grande distorção por todos, docentes e discentes, no que liberdade (pregada no projeto pedagógico) significa. Para muitos parece que liberdade significa “Faço e que quero, como quero e ninguém tem o direito de me dizer o contrário”.   Sinceramente, para mim a liberdade é algo como “Tenho o direito de fazer minhas escolhas e devo fazê-las com responsabilidade, pois eu e todos a minha volta terão de arcar com todas as consequências do que eu fizer”.

Nesta semana, passaram algumas resoluções polêmicas na Comissão de Graduação, uma resolução declara que apenas alunos com CR maior que 2,0 poderão se inscrever em monitoria acadêmica. Outra resolução cria uma fórmula [ C = 16+ 5*CR, se CR< 3,0 ] que limita o número máximo de créditos que um aluno pode se matricular. Não vou discutir se há justiça nestas normas, não ainda. Neste texto, quero apenas apresentar para que cenário de Universidade isto nos leva.

A cada dia fica mais claro que a UFABC institui um regime de ‘CRcracia’, ou seja, o CR do aluno que comanda quais são seus privilégios, direitos e deveres. Alunos com CR menor que 2 são cortados de basicamente qualquer processo para bolsas de estudos (de mérito acadêmico), requisitar netbooks, etc. Alunos com CR maior que 3 tem direitos plenos e não precisarão cumprir qualquer limite de créditos, ou seja, a universidade considera que estes alunos tem a responsabilidade necessária para exercer a liberdade sem limites. Quanto aos outros, restrições são feitas com uma promessa simples: se eles alcançarem CR > 3, também poderão ter acesso ilimitado a tal liberdade. Podemos dizer que "grandes CRs trazem maiores liberdades". 
   
O grande problema de um sistema tão fortemente baseado em CR é que distorções em seu cálculo causam graves erros de julgamento e, consequentemente, injustiças para com os alunos. Professores com sistemas de avaliação abusivos podem trazer um grande desequilíbrio, por isso a Universidade precisa ‘reeducar’ seus professores sobre os métodos de avaliação, incluindo o que consideramos adequados como conceitos. Afinal, nem mesmo o valor de um 'D' nós bem sabemos e cada um pratica sua própria tabela de valores.  Por outro lado, medidas mais severas quanto a praticas de plágio e ‘cola’ devem ser tomadas. Um aluno que age de forma ilícita pode ficar com uma nota melhor que um aluno que realmente se esforçou e isto é uma grande injustiça. É preciso um código de ética que puna severamente aqueles que agem de má fé. Acho que a Universidade é muito branda e até omissa em relação a isso: Um aluno que fosse pego colando em uma prova, deveria ser reprovado na disciplina. Caso o aluno fosse reincidente nesta prática, deveria ser instaurada uma comissão que julgaria medidas tais como ‘jubilação’ para tal aluno. Afinal, o projeto pedagógico também prega que o aluno seja responsável pela sua formação e a faça de forma correta, sem subterfúgios ou práticas ilegais. 

Nas próximas semanas, ainda se falará muito sobre todas estas resoluções. A grande maioria dos alunos simplesmente se sente injustiçado e justifica o erro de tal medida citando o caso de um ou outro. Desculpe-me, mas as regras são feitas para serem validas para mais de 5000 alunos. Um caso que é uma exceção não pode nortear como são criadas as regras.  De nada adianta vociferar que algo é ruim se você não é capaz de propor algo melhor. Se um aluno ou professor aparecesse com um norma que contemplasse a solução de nossos problemas de forma efetiva e prática, eu apoiaria tal proposta imediatamente.  Entretanto, tudo que tenho visto são queixas, propostas mal elaboradas ou afirmações demagógicas pouco pensadas em relação a universidade real que temos em nossas mãos. Muito fácil acusar os outros de destruir seus sonhos, mas por acaso você está construindo sua realidade condizente com eles ou só esperando que o façam por você? 

Meu pai costumava dizer que "liberdade a gente conquista e se você age como criança será tratado como criança". Sei que este texto fará muitos alunos (e alguns professores) se sentirem ofendidos. Contudo, se muitos não estivessem ‘abusando’ das regras, você acha que as pessoas se preocupariam em criar novas regras mais restritivas? Alunos com CR > 3 não tem restrições; fica aqui uma insinuação nada sutil do que se espera de um aluno da UFABC.  


A Universidade costuma agir como um organismo. Qualquer organismo, quando colocado em um desequilíbrio nocivo, aciona mecanismos para reestabelecer o que considera a sua situação ideal. O limite de créditos é apenas a primeira leva de anticorpos, creio que muitas outras levas ainda estão por vir.  A UFABC precisa encontrar um grupo de regras que esteja de acordo com o projeto pedagógico, mas que permita um gerenciamento racional e eficiente de seus recursos. O projeto pedagógico é belo porém igualmente vago; nele se desenham linhas gerais de um sonho, mas não as instruções para que este seja conduzido à realidade. Devemos trabalhar muito, sem falsas demagogias, para criar a verdadeira UFABC e conquistar a Liberdade de Ação da qual consideramos sermos merecedores. 

3 comentários:

  1. Primeiramente, eu li o projeto pedagógico e muitas vezes... Entretanto, diferente de você, não acho que só copiar e citar trechos longos dele signifique que eu o entendi. Você me parece muito hábil em citar como as coisas deveriam ser. Contudo, completamente incoerente ao dizer que não tem interesse ou tempo para participar das instâncias que o tornam real. O projeto pedagógico sem as pessoas que o implantam na Universidade não passa de palavras bonitas e nada mais.

    Sinceramente, eu gostaria que pessoas como você que parecem saber tanto sobre o projeto pedagógico e tenham tanto a dizer também tivessem a coragem de assumir o peso do trabalho real participando de conselhos superiores, comissão de graduação e outros orgãos nos quais você poderá fazer muita mais diferença do que apenas se queixando como os outros não tem compreensão e de como 'todos matam o projeto'. Por favor, nos ilumine, mas não por palavras bonitas, estas apenas se perdem no vento, assuma a responsabilidade por sua liberdade e parta para a ação onde ela poderá fazer a diferença.

    Sinceramente, não concordo com o rumo da CRcracia da UFABC, porém não vi ninguém, nem mesmo as pessoas que dizem entender tão bem o projeto, virem com proposta melhor que realmente funcione.

    De qualquer modo, em meu blog, eu apenas expresso minha opinião de como vejo o mundo. O que desejo é colocar certos temas em discussão. Pois ainda há muito o que compreender... Pessoalmente, acredito que ninguém entende o projeto pedagógico da UFABC. Entender aqui com o significado de colocá-lo em prática para mais de 5000 alunos. Entretanto, sempre estarei aberto a discussões e você está sempre convidada a compartilhar seu ponto de vista neste espaço de comentários. Mais que isso te incentivo a se candidatar aos conselhos que tomam as decisões, pode apostar que votaria para que você estivesse neles se pudesse. Desculpe-me, mas acho que você só entende a dificuldade de resolver um problema, quando você realmente tenta fazê-lo.

    Creio que devo terminar como você: Acho que você deveria ler (de verdade) o projeto e pensar como fazê-lo funcionar. Se você não está interessada em tomar as decisões e colocar efetivamente suas mãos para construir o novo modelo de universidade publica no Brasil, não sei se você consegue entender o que está em jogo e o que precisa ser feito. Porém, isso é apenas minha humilde opinião.

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  2. Eu desconhecia o seu blog, de fato, pude ler algumas coisas que escreveu e acho que não pensamos tão diferentes. Contudo, confesso que trato todas as questões (mesmo pessoais) sob a ótica da física a luz do método científico. De certo modo, desconheço a maneira das áreas de humanas, mas achei divertida suas breves palavras sobre pessoal de humanas e exatas. De qualquer modo, fui sincero ao dizer que acho que alunas como você deveriam participar do processo efetivo de normas da UFABC. Os alunos carecem de muita mobilização e uma representatividade persuasiva para ter alguma chance de criar uma UFABC com aspectos mais amistosos para os estudantes. Ficarei de olho em seus escritos, mas acho que blogs são um forum ainda bem limitados para discussão. Espero que você mude de ideia e participe dos colegiados da UFABC e lá possamos discutir e comparar nossos pontos de vista.

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  3. A minha impressão é que o modelo da UFABC seria perfeito se a pessoa fosse fazer apenas o Bacharelado interdisciplinar. Mas enquanto o BC&T é flexivel os cursos pós-BC&T são "engessados" Então a necessidade de fazer os cursos pos-BC&T tiram a liberdade do BC&T.

    Acho que os passos que estão sendo dados são positivos. Parabnes pelo blog!

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