domingo, 10 de julho de 2011

Um cubo de SETE faces




Na Universidade há diversas épocas críticas e tensas. Um dos períodos mais complicado é o da matrícula, que sempre trás mal-estar a todos. Os sintomas surgem nos docentes, discentes e funcionários (principalmente, os da PROGRAD tão ‘lembrados’ neste período): irritabilidade, preocupação com o futuro, tentativa de adequar novos horários a velhas rotinas, questionamento de regras e formas de atribuição. Poderíamos até mesmo nomear, com toda a razão, de Tensão Pré Matricula (TPM).  No caso da UFABC, isso é ainda mais crítico porque temos três períodos destes por ano, efeito natural de nosso sistema quadrimestral.


De certo modo, o problema é similar às enchentes do nosso caro Tamaduateí: todos nós sabemos que no verão haverá chuvas e, possivelmente, enchentes. A prefeitura deveria cuidar para que o aumento do nível do rio não trouxesse tantos problemas. Contudo, sempre há problemas... Nossa tendência é considerar que a incompetência do governo é a responsável, o que em parte é bem verdade. Mas quando você passeia perto as margens do rio e observa muito lixo, pneus e, até mesmo, um sofá inteiro?!?  Começa a questionar: Mas precisava mesmo jogar o sofá no rio?  De fato, a prefeitura é a responsável, mas não faz mal cada pessoa evitar tornar o problema ainda mais complicado, não acha?


O paragrafo anterior era apenas para construir o paralelo com o que acontece na UFABC durante a matrícula. O processo de matrícula envolve praticamente todas as pessoas da UFABC e não é nada simples...  Apenas para colocar alguns números, no quadrimestre passado foram oferecidas 813 turmas (apenas na graduação). O número de disciplinas e turmas por quadrimestre tem crescido assustadoramente e de forma muito mais acentuada do que a contratação de novos docentes!


Todo o processo de matrícula começa com PROGRAD e Coordenações dos cursos apresentando as matérias que serão oferecidas, que são decididas seguindo o projeto pedagógico de cada curso, demandas reprimidas de certas disciplinas e requisições dos estudantes. Nós docentes, recebemos uma lista prévia das disciplinas, da qual escolhemos 5 delas (3 do BI e 2 de cursos pós-BI) ainda sem definir horário, para que o coordenador do curso, depois a direção do centro e, por fim, a PROGRAD definam as disciplinas e número de créditos de cada professor. Em paralelo a isso, também é definido o horários de cada disciplina e, principalmente, sala ou laboratório em que será ministrada. Algo crucial porque ainda estamos em construção e o espaço para lecionar é limitado. Isto faz importante a possibilidade de ocupar todos os horários, inclusive sextas à noite e sábados durante o dia...  Em que ninguém gosta muito de lecionar ou estudar, mas não fecharíamos a atribuição de créditos (em especial, para cursos do noturno) sem essa opção.


Ouvi muitas vezes dos alunos da UFABC que fazer a grade do quadrimestre é como “brincar com um cubo mágico: quando você acerta um lado, acaba desarranjando o outro”. Saiba que a atribuição é um CUBO DE SETE FACES para todos nós!  Neste aspecto, os alunos recebem uma lista que consta de centenas de turmas das mais diversas disciplinas obrigatórias, opção limitada ou livres e que devem se acertar em sua semana. Lembro ainda que muitas vezes os alunos tentam seguir mais de um curso (pelas regras, um aluno pode se matricular em até três cursos pós-BI) que muito possivelmente tem conflitos de grade, uma vez que cada coordenação define seus horários independentemente e fica bem difícil prever exatamente que disciplinas não deveriam conflitar. A UFABC permite uma grande liberdade de escolha, mas não somos capazes de prever todos os anseios dos estudantes, mesmo porque alguns nem seguem um plano bem claro de disciplinas a cursar. 


Uma complicação ainda maior em questão aos alunos é o trancamento, muitos alunos tem consciência disso como percebi num texto que li no Facebook outro dia e que me inspirou a escrever este texto. Pelas regras um aluno pode trancar até duas matérias. Isso faz com que o aluno considere que ele deve se matricular em N+2 disciplinas, ou seja, ele inflaciona a demanda que chega a PROGRAD em 2 turmas... Parece pouco, mas se os  mais de 3000 alunos fazem isso, o que teremos são turmas que começam com 30 alunos e terminam com apenas 6 (eu já vi isso algumas vezes). Podemos considerar que a Universidade está tendo um prejuízo de 24 vagas abertas não utilizadas. Além disso, foi necessário atribuir um número muito maior de turmas para o docente lecionar.  Nem é preciso dizer que, com o aumento da quantidade é bem comum uma queda de qualidade. Outro ponto é o valor de N, que alguns alunos consideram que o importante é preencher o máximo possível sua grade. De fato, acredito que cada aluno deve avaliar seu ritmo e capacidade e se matricular num N que permita a ele cumprir bem com as disciplinas e ainda ter uma vida saudável. Antes fazer 4 matérias e obter As e Bs, que 8 matérias com Ds e Fs, o seu CR vai agradecer e você bem sabe como o CR é importante na dinâmica de ICs, monitorias e outros direitos UFABCianos.


Os professores também tem sua parcela de culpa. Obviamente, ninguém gosta de dar aulas aos sábados e muitos têm problemas com aulas noturnas. Porém ao ser contratados pela Universidade, aceitamos a dedicação exclusiva e com ela a possibilidade de lecionar de segunda a sábado em qualquer horário (e até mesmo mais de um câmpus). Mesmo que haja questões ligadas à vida pessoal, isso não deve interferir com o trabalho. Todos os professores tem a obrigação de cumprir com sua carga didática nos horários que são precisos, não naqueles que eles preferem. Afinal, os que não têm ‘tantos problemas pessoais’ não devem ser obrigados a se encarregarem sempre dos ‘horários ditos ruins’. Claro, que sempre que possível, os horários de aula devem ser ajustados de forma que não afetem tanto a pesquisa e assuntos de outras obrigações. Porém, nem sempre é possível fazer o melhor para todos... Acima de tudo, devemos assumir certas soluções de compromisso, algo que não seja tão ruim para alunos e professores.


As coordenações dos cursos também devem ter o cuidado de primeiramente oferecer as disciplinas designadas em seus quadrimestres ideais. Os alunos que seguem “religiosamente” a grade sugerida devem ser privilegiados. Além disso, ouvir o que os alunos querem fazer (principalmente, para disciplinas livres) é algo importante. Não faz sentido algum abrir uma disciplina que nenhum aluno está interessado em cursar.  As novas coordenações eleitas tem, em muitos casos, a presença de discentes, o que deve tornar o processo de ‘ouvir o estudante’ mais eficiente.  Mesmo naquelas que não há discentes, os alunos precisam apresentar suas necessidades específicas ao coordenador, desde que as reinvindicações sejam razoáveis e apoiadas por um bom número de estudantes, não há como o coordenador não ouví-las.


A PROGRAD tem o papel de ser JUÍZ e EXECUTOR, o que não é nada fácil. Acima de tudo, naquela mesa é que devem ser gerenciados os conflitos entre Direções dos três Centros, docentes e discentes. Acima de tudo, deve ser lembrado que a oferta de disciplinas não é uma disputa entre professores e estudantes. Não é uma batalha em que deverá haver um ganhador e um perdedor. Muito pelo contrário, é um acordo de parceria entre professores e alunos na busca de construir um ambiente de harmonia em que todos possam buscar sua excelência e alcançar seus objetivos de forma mais eficiente.


Para terminar, eu ainda aguardo para saber qual disciplina irei lecionar no próximo quadrimestre, também não faço ideia de quantos créditos terei ou quais serão meus horários de aula, sei que isso é desgastante e me deixa cheio de incertezas, principalmente, quando lembro que devo acertar o ‘cubo de horários’ com todas as minhas obrigações de pesquisa, extensão e as outras esferas de minha vida.  Contudo, devemos agir e decidir sempre com discernimento e maturidade. É claro, que a PROGRAD tem suas obrigações e muita responsabilidade no processo, mas nós, docentes, discentes e funcionários, podemos ajudar muito apenas evitando ‘jogar sofás no rio’ quando realizamos nossas escolhas.

Um comentário:

  1. Parabéns pelo texto, ele retrata bem toda essa confusão e irritabilidade dos períodos de matrícula.

    Outra dor que você pode não ter sentido mas nós alunos sim é o fato de disciplinas obrigatórias não serem mais ofertadas a tarde (apenas em casos em que se enquadrariam como "DP"). Isso porque, contando apenas os horários de manhã ou a noite, isso resulta em no máximo 20 créditos, isso quando se faz o milagre de ter esses horários completos, bonitinhos. Aí, como sempre se tem o medo de se querer trancar alguma, como é citado no texto, ou então se o aluno está atrasado e acha que 20 créditos é muito pouco, não tem jeito: tem que matricular de manhã e a noite. Aí, fica terrível, ninguém dorme bem, mais stress. Mas isso não é culpa da universidade, pois tem que ser assim, já que nenhum curso daqui é integral em teoria (em teoria, claro). Paciência.

    Sobre encaixar o horário, um menino abençoado eternamente por deus fez um aplicativo no site de matrícula simples, mas incrivelmente lindo e maravilhoso: você seleciona as disciplinas que quer cursar e as restrições e ele gera alguns horários possíveis. Nossa, isso economizou uns 500mg de fósforo no meu cérebro, que eu pude usar pra estudar para as primeiras P2, haha.

    E pois é, essa Tensão Pré-Matrícula realmente vem e mexe com a gente! Bem que eles podiam servir chocolate no RU pra dar uma remediada, né?

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